segunda-feira, 14 de outubro de 2019

COLONIA MINEIRA (SIQUEIRA CAMPOS - PARANÁ): alguns acontecimentos de abril de 1930.

Apontamentos Históricos da Colônia Mineira e Siqueira Campos no Norte Pioneiro do Estado do Paraná

Prof. Roberto Bondarik, Dr.
bondarik@utfpr.edu.br
bondarik@outlook.com

Tendo pesquisado sobre os acontecimentos relacionados à Revolução de 1930 no Norte Pioneiro Paraná, chamado aquele tempo de "Ramal Ferroviário do Paraná". Chama a atenção o desenvolvimento socio-econômico da região nos momentos proximos ao confronto bélico que se fez sentir em Affonso Camargo (atual Joaquim Távora-Pr) e em Quatiguá. A então Colônia Mineira (atual Siqueira Campos) teve um papel importante na preparação da Revolução e nos acontecimentos decorrentes de sua efetivação.

Não tenho conhecimento sobre se exatamente, na história da cidade de Siqueira Campos se mantem registros sobre o que se passou ali em abril de 1930, fatos publicados no jornal "O Estado de São Paulo" edição de 18 de abril de 1930, página 20. Sessão denominada "Notícias do Paraná", destacava em especial a reinauguração do serviço de iluminação da Companhia de Luz e Força Sul-Paulista e o estabelcimento do serviço telefonico na cidade em conexão com Itaporanga, Estado de São Paulo.

Assim, transcrevo o que foi publicado pelo jornal, considerando-o um ipontante documento para a história da Colônia Mineira e para a História de Siqueira Campos, importante também para a compreenssão do Norte Pioneiro do Paraná àquele tempo. Infelizmente não á referencia a respeito de quem fosse o correspondente do Jornal na cidade:

(Segue a transcrição - conforme ortografia da época)
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COLÔNIA MINEIRA - 10 (Do nosso correspondente) - Esteve nesta cidade, há poucos dias, o dr. Joaquim Mario de Sousa Meirelles, gerente da empresa de força e luz Sul-Paulista que veiu afim de assistir a ligação dos fios da illuminação e dos telephones, que vem de Itaporanga.
Esse melhoramento é devido ao actual prefeito municipal, coronel José Innocencio dos Santos, que entrou em novo accordo com aquella empresa, pois a administração municipal passada, apoderan-se da usina, nos privou da illuminação electrica, durante um anno e meio.

SEMANA SANTA
Durante as festas religiosas da semana santa serão inaugurados tres sinos na egreja matriz local, adquiridos por subscrição pública e graças aos esforços do nosso vigário que angariou os donativos.

TIRO DE GUERRA 676
Procedentes de Curitiba aqui chegaram os officiaes do Exercito que procederão aos exames dos reservistas do Tiro de Guerra 676.

NOTICIAS DIVERSAS
Regressou de sua fazenda em Laranjinha, o coronel José Innocencio dos Santos, prefeito municipal.
- Seguiu para Itararé o sr. Lourenço Dias Tati.
- Esteve aqui o sr. Luis Guimarães, procedente de Curitiba.
- A prefeitura municipal vae arborisar a praça dr. Eurides Cunha.

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Comentários:

Compreende-se da leitura e análise deste breve documento histórico (jornais são fontes históricas) que havia uma certa depedencia e ligação forte de Siqueira Campos com Itaporanga no Estado de São Paulo. A conexão telefonica da cidade deu-se com aquela e a Companhia de Força e Luz Sul-Paulista era quem fornecia energia eletrica. Os serviços basicos de infraestrutura foram objeto de disputa entre grupos politicos locais.
Destaca-se a inauguração dos tres sinos da Igreja Matriz local, comprados com dinheiro arrecadado pelo padre junto a população da cidade. Estes sinos devem ser os mesmos que ainda hoje são utilizados na Igreja.
Havia um Tiro de Guerra na cidade e que formava atiradores e reservistas para o Exercito Brasileiro.
Havia uma ligação entre Siqueira Campos, seus habitantes e a colonização do sertão do Rio Laranjinha.


quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Origens Históricas de Quatiguá - Estado do Paraná


História de Quatiguá: origens e formação da cidade

Prof. Roberto Bondarik, Dr.


            Segundo consta nos registros históricos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Quatiguá foi fundada em 1903 pelo sertanista Orlando Ferreira de Paiva. Sendo ele o primeiro a edificar uma casa no local onde hoje é a cidade. Não existem em documentos ou outras fontes, maiores menções a esse fundador, também não há registros sobre as motivações que o levaram a escolher esse local para habitar. A tradição histórica local tende a confirmar essa informação.
            Ao que tudo indica, essa edificação deve ter sido feita quando da abertura da “Estrada do Borromei”, construída a partir de Jacarezinho em direção à Colônia Mineira (atual Siqueira Campos), passando por Tomazina e, finalmente atingindo os Campos de Piraí do Sul e algum ponto da Ferrovia São Paulo – Rio Grande do Sul. O responsável pela execução da obra foi o engenheiro Carlos Borromei, italiano de nascimento e funcionário da Secretaria de Estado da Viação e Obras Públicas, ao final ele próprio acabou residindo em Jacarezinho após adquirir ali uma fazenda e tornar-se também produtor de café.

“Do senhor engenheiro Carlos Borromei, communicou-se que nesta data foi encarregado da direção da construção da estrada que do Jacarezinho, vae ao Pirahy (...)” (Fonte: Jornal “A REPÚBLICA”, Curitiba, 06 de Maio de 1903, p.01)

Estrada do Borromei
Fonte: detalhe de mapa do Estado de São Paulo editado em 1912 e disponivel no Arquivo Público daquele Estado

            A estrada foi construída nas terras altas do divisor de águas entre as bacias hidrográficas dos rios Jacaré e das Cinzas, medida que evitava a travessia por dentro de cursos d’água ou a construção e a manutenção de pontes. O objetivo era facilitar o escoamento da produção de café do entorno de Jacarezinho que, aquele tempo tinha apenas uma trilha de tropas que a ligava a Santo Antonio da Platina e consequentemente ao restante do Paraná. A iniciativa também visava atrair a incipiente produção agrícola do Norte do Paraná para Curitiba e os gêneros exportáveis para o Porto de Paranaguá. A estrada cortava uma região sem povoados e escassamente povoada, em especial o trecho de pouco mais de oitenta quilômetros entre Jacarezinho e Colônia Mineira. Sua abertura significaria a integração econômica do Norte do Estado com o restante do Paraná e até seus portos, visando o comercio internacional, dando importância financeira e valor às terras, sua produção e riqueza a seus habitantes. Gastava-se mais no transporte dos produtos do que com a sua obtenção:

O nosso commercio se acha mais ou menos paralysado, e não fora essa crise que tomo a Esphinge da Mythologia, assolará o nosso pobre Brazil até que tenhamos um novo Edipo que decifre o seu enigma, e esta localidade já andaria muito longe na senda do progresso. Elementos tem de sobra à começar pela pujança do seu solo secundada hoje pela nova estrada de rodagem mandada construir pelo benemérito dr. Governador do Estado, auxiliado pelo distincto engenheiro dr. Candido de Abreu.
Antes de se começar a construção o preço da arroba de café para conduzir em tropa, até o Pirahy, era de quatro mil reis e até de quatro mil e quinhentos reis!
Hoje, 2 annos, apezar de não estar ainda prompta a estrada, paga-se somente mil e seiscentos reis. A diferença já é grande e maior será quando a estrada varar para o campo recebendo directamente o viandante que dará graças aos céus por não ter mais que subir ou descer as alterosas serras da Natureza, Colônia Mineira e Jaboticabal. A construção, a cargo do não menos distincto engenheiro dr. Carlos Borromei, acha-se já na Colônia Mineira com 82 kilometros, com picadão, se acha a 12 kilometros além da Colônia, em demanda do Campo onde sahirá talvez com pouco mais de 30 kilometros.
O encurtamento da distância entre o Jacaresinho e o Campo sendo notório, além da magnifica topografia do terreno percorrido, é claro e fora de dúvida que esta estrada será para esta zona um extraordinário benefício.
Que se recolham, pois, os despeitados que querem fazer crer o contrário; e o tempo melhor dirá de que lado está a razão (DIÁRIO DA TARDE, 24 JUL. 1903, p.01).

            A estrada foi construída a mando do Governo do Estado do Paraná, ao custo total de 200:000$000 (duzentos contos de réis). Sua construção deve ter demandado pelo menos uns dois anos inteiros e seus idealizadores enfrentaram oposição daqueles que achavam melhor investir na chamada “Estrada Velha”, aberta pela Câmara de Vereadores de Thomazina e que ligava a aquela cidade ao povoado de Santo Antonio da Platina, seguindo próxima ao Rio das Cinzas, passando pelos atuais Distrito do Sapé, pelo patrimônio da Barra Grande, que aquele tempo existia na foz do Ribeirão com esse nome. Localidade transferida a posteriori para a atual Guapirama. Ao que consta os núcleos urbanos ao longo desse caminho dariam maior segurança aos viajantes até atingirem Jacarezinho, por tempos chamada de Ourinho. A falta d’agua no traçado da Estrada do Borromei era um argumento forte, porém era rebatido pelos seus defensores como podemos ver:

Continuando a occuparmo-nos da nova estrada de rodagem entre o Jararesinho e Pirahy, precisamos salientar a abundância d’agua que se encontra em seu percurso.
É um facto cuja contestação só pode ser feita por má fé e crida por quem indiferente aos progressos do nosso Estado não procura indagar da verdade e se deixa impressionar pelo que primeiro se lhe informa, sahindo logo a pregar que esta estrada é um monstrengo!
Não é tal: é um elemento de progresso desta zona, é a communicação melhor que temos para aqui ser mais curta, é a mais suave por ter melhor topografa, pois não tem rampas de mais de 10 graus, a declividade permitida em estradas de rodagem; é finalmente a mais commoda porque os córregos que dão de beber aos animais são mais próximos uns dos outros. E senão vejamos. A partir da villa do Jacaresinho no kilometro 8 se encontra o rio Jacaresinho; no kilometro 15 o córrego da Capivara com bom volume d’agua e que passa por dentro de uma fazenda; no kilometro 20 há um morador, no fundo de cuja casa passa um córrego chamado do “Pinto”; no kilometro 24 há também um córrego, onde já os tropeiros fazem pouso; no kilometro 26 há um pequeno córrego, no kilometro 29 – Pedra Branca há um morador e rancho para tropeiros; no kilometro 32 há um pequeno córrego; finalmente nos quilômetros 36, 41, 42, 49, 57, 60, 61 e 64 há agua e em quase todos tem moradores já; dai por diante entramos na fazenda da Colônia Mineira, onde de meia em meia légua, no máximo, se encontram moradores e também pastos para os animais até o kilometro 82 na sede da Colônia.
Como se vê a maior distância que se caminha sem água é de 8 kilometros.
Ora, se tanta água não se tinha necessidade, pois quantos e quantos córregos passam os animais sem beber água mesmo no verão.
Em quase todos esses córregos acham-se signaes de pouso das tropas. Capim não falta, porque o constructor da estrada com inteligência o semeou em toda a margem para o duplo fim de apascentar os animaes das tropas e evitar que o matto viceje, prejudicando o trânsito e o seccammento do terreno, o que é natural em terras fortes como em geral são as desta zona.
O mesmo já não se pode dizer em relação às outras estradas por onde se chega a caminhar até 3 léguas sem se encontrar uma gotta d’agua, como acontece na estrada de Thomazina, pela Serra da Natureza, e mesmo por S. José da Boa Vista há pontos seccos de quase duas léguas.
Pelo celebre picadão entre Thomazina e S. Antonio da Platina, nem por experiencia, afim de conhecer é detestável, aconselhamos a que passem por lá passem. Tem trechos longos também sem água e é de princípio a fim, em todos os tempos, um atoleiro medonho. A nova estrada não demorará muito a ser transitada por carroças, pois já se acham promptas algumas pontes, e uma vez entregue de todo a esse trânsito, veremos a nossa zona prosperar, e muito, porque só nos estão faltando os meios fáceis de transporte para o que se produz.
Por enquanto os transportes absorvem os produtos das vendas e por isso o retrahimento é grande. A exportação dos nossos gêneros para fora do Estado, pelos seus portos, é o nosso Ideal.
Torna-se, porém, necessário para essa realização, que depois da estrada tenhamos o abaixamento das tarifas nas estradas de Ferro. Isso se dará? Esperemos, contando com os esforços do actual governo do Estado, que tudo tem procurado fazer a bem da nossa prosperidade, e com a influência do nosso ilustres chefe dr. Vicente Machado, junto ao União (DIÁRIO DA TARDE, 29 out. 1903, p.02).


Detalhe da Estrada do Borromei entre Jacarezinho e Colonia Mineira (atual Siqueira Campos Paraná), grafado erroneamente como Colônia Militar

           A fertilidade do solo, o crescimento rápido da mata derrubada em seu longo trajeto, a falta de manutenção aliada ao sertão inóspito e quase desabitado, fizeram com que em poucos anos a estrada fosse abandonada a sua própria sorte:

Não sabemos qual a razão de achar-se abandonada e coberta de matto a estrada de rodagem que da Colônia Mineira vai a Ourinhos e na qual o governo gastou 200:000$000. Devido o estado em que se acha essa estrada. Estafeta do Correio, que de Thomazina ia para Ourinhos, passando pela Colônia Mineira, vê-se obrigado chegar a esta, voltar a Thomazina para dahi seguir a Ourinhos pela estrada velha. Pedimos ao exmo. Sr. Dr. Governador do Estado, lançar as suas vistas para essa importante via de communicação, presentemente abandonada por falta de roçadas na extensão de 82 kilometros. Há quem se proponha a fazer esse serviço por 2:000$000, deixando livre trânsito para cargueiros (DIÁRIO DA TARDE, 13 nov. 1905, p.01).

            Foi ao logo do traçado dessa estrada do Borromei, ou em suas proximidades que Quatiguá foi fundada, inicialmente como dois pequenos povoados: Barra Grande e Chapada. Nome das duas grandes glebas que, subdivididas, deram origem ao Município. Uma vez unificados com a chegada do Ramal Ferroviário do Paranapanema em 1919, o povoado de Quatiguá tirou o seu nome do serro próximo: Serro do Quatigual. Esse nome já figurava nos documentos que, em 1890, determinavam os limites do Distrito e do Termo de Jacarezinho. Assim a cidade cresceu, em meio a mata, a beira das encostas da serra, nos campos, os cafezais que surgiram. Em 1924 já despertava a atenção:

Quatiguá era, até bem pouco, o último ponto da via férrea. É um logar bonito, erguido no meio de matta expessa onde se encontram as madeiras mais raras. Metade do povoado pertence à Colônia Mineira e a outra metade é da jurisdicção platina.
Um bom hotel, modesto, mas limpo e commodo, atende a freguesia que ahi aporta, com a mesma solicitude de uma casa de família, gentil em obsequiar os hospedes (MARTINS, 1924, parte III, p.01).

            A Estrada do Borromei não se manteve, mas seu traçado conhecido, usado como trilha ou picada, serviu de base para a construção da Ferrovia que desde Jaguariaiva iria atingir Ourinhos em São Paulo. Também uma nova estrada de rodagem foi aberta ao lado da ferrovia:

Nas paradas obrigatórias, o major Infante Vieira mostrava-nos o serviço que fizera, abrindo aquelle caminho onde ainda se percebiam vestígios da antiga picada Borromei que em tempos fora feita para ligar o sertão Norte a Thomazina (MARTINS, 1924, parte VI, p.01).


 Novas histórias antigas virão.

 Referências:

PELO ESTADO: Pirahy. Diário da Tarde, Curitiba-PR, p.01, 13 nov. 1906;
PELO ESTADO: Jacaresinho. Diário da Tarde, Curitiba-Pr, p.01, 24 jul. 1903;
PELO ESTADO: Jacaresinho. Diário da Tarde, Curitiba-Pr, p.02, 29 out. 1903;
A REPÚBLICA, Curitiba, 06 de Maio de 1903, p.01;
MARTINS, Romário. Sertão em Flor: o Paraná Cafeeiro – parte III. O Dia, Curitiba-PR, pp.01 e 08, 21 jun. 1924;
MARTINS, Romário. Sertão em Flor: o Paraná Cafeeiro – parte VI. O Dia, Curitiba-PR, pp.01 e 08, 26 jun. 1924;
TOMAZI, Nelson Dácio. Norte do Paraná: histórias e fantasmagorias. Curitiba: Aos Quatro Ventos, 2000;
WACHOWICZ, Ruy Chistowam. Norte Velho, Norte Pioneiro, Curitiba: Gráfica Vicentina, 1987;
______. História do Paraná. 6ª ed. Curitiba: Gráfica Vicentina, 1988;