quarta-feira, 4 de julho de 2007

A INDUSTRIALIZAÇÃO DA ERVA-MATE E SUAS CONSEQÜÊNCIAS PARA O ESTADO DO PARANÁ

[Continuação do texto anterior - 3 de 3]
A modernização definitiva da indústria da erva-mate deu-se pela ação do engenheiro Francisco Camargo Pinto, que devido as suas habilidades mecânicas estudou no Arsenal da Marinha de Guerra e especializou-se na Inglaterra e Alemanha. A sua ação e percepção inovadora transformou os engenhos rústicos em indústria de beneficiamento da erva-mate.
De volta ao Brasil, a partir de 1878, Francisco Camargo Pinto, dedicou-se a aperfeiçoar e a desenvolver máquinas destinadas ao trabalho de beneficiamento da erva-mate. Ele foi responsável pela instalação do “Engenho Tibagy”, pertencente a Ildefonso Pereira Correia, que ficou conhecido como Barão do Cerro Azul, onde pode ser promovida uma verdadeira revolução nos equipamentos e no processo de produção deste. Segundo Wachowicz (1988), as instalações do “Engenho Tibagy" foram transformadas de engenho para indústria, no exato sentido que a palavra transmite. Suas principais inovações foram:

a) Esmagador ondulatório;
b) Separadores por ventilação;
c) Torrador mecânico;
d) Elevadores e transformadores helicoidais, etc.

Costa (1995) contradiz Wachowicz ao chamar o estabelecimento de “Fábrica Tibagy”, e fazer uso da expressão indústria, denominação que pode ser julgada mais condizente com a natureza produtiva do negócio. Porém destaca o aspecto inovador do empreendimento:

Depois da abertura da Estrada da Graciosa e quando se iniciou a construção da Estrada de Ferro Curitiba-Paranaguá transferiu a sua indústria ervateira para Curitiba. Construiu no Bairro do Batel, em 1878, a Fábrica Tibagy que ficou assinalada na história da economia ervateira pelas grandes inovações tecnológicas da época para o preparo da erva-mate, mediante a introdução do motor a vapor, trituradores, peneiras e compressores mecânicos.” (COSTA, 1995, p. 65-66)
A mecanização da produção levou, como dissemos, a uma transformação referente ao aspecto do trabalho. A escravidão foi substituída pelo trabalho assalariado. A complexidade decorrente da continua industrialização passou a exigir cada vez mais um trabalhador alfabetizado, conforme afirmado por Wachowicz (1988). Assim escolas tiveram de ser implantadas, foi incentivada a educação da população para satisfazer a essa necessidade da indústria.

“(...) As transformações da indústria do mate, ocorridas durante a segunda metade do século XIX, as inovações técnicas e o predomínio do trabalho livre são marcas importantes do progresso dessa produção (...)”. (SANTOS, 2001, p.52)

O processo de modernização e criação da indústria da erva-mate resultou em uma série de mudanças produtivas e sociais. A primeira inovação decorrente desse processo foi a constatação de eram necessários melhores meios de transporte entre o planalto de Curitiba e o Litoral. Feito inicialmente por tropas de muares, percorria-se os caminhos e as trilhas da Serra do Mar. A Serra era o maior obstáculo para uma melhoria efetiva do transporte e do aumento da produção e produtividade da erva-mate. O transporte por meio das tropas de muares possuía um elevado grau de dificuldade, percebida por Auguste Saint-Hilaire, viajante e naturalista francês que percorreu os Campos Gerais, Curitiba e o Litoral por volta de 1820. Ele foi o primeiro a realizar uma descrição cientifica da erva-mate (Ilex Paraguaiensis) e também testemunhou as dificuldades dos caminhos e trilhas da Serra do Mar:

A pior parte do caminho é onde começa a descida, e que tem nome de encadeado. O declive é abrupto demais, os ramos das árvores se estendem por sobre o caminho, escavado na montanha, tornando-o muito sombrio, e o chão é formado de pedras grandes e escorregadias, o que as vezes obriga as mulas a acelerarem o passo. Eu não me cansava de admirar a habilidade desses animais para se safar de situações difíceis. Eles são treinados inicialmente para fazerem a travessia da serra sem nenhuma carga no lombo, em seguida levando apenas a cangalha e, finalmente transportando a carga.” (SAINT-HILAIRE, 1995, p.139)

Os problemas decorrentes dos transportes foram resolvido quando teve inicio em 1855 a construção da Estrada da Graciosa e sua posterior conclusão em 1873. Essa estrada possibilitou a utilização de carroções, mesmo assim a demanda por transporte não era satisfatoriamente atendida. A ferrovia que solucionou definitivamente a questão da demanda, atravessando a Serra do Mar, por sua vez foi construída entre os anos de 1880 e 1885 constituindo-se em um grande feito de engenharia para os recursos tecnológicos da época. Conforme já evidenciado, a construção destas vias de transporte favoreceu o desenvolvimento de Curitiba.
Com as facilidades dos transportes, engenhos começaram a ser implantados na região de Curitiba e acabaram por modificar a estrutura econômica da região. Segundo Santos (2001), o deslocamento de engenhos do litoral em direção a Curitiba e a construção de novos estabelecimentos, demonstram esse novo clima econômico vivenciado na segunda metade do século XIX.
O número de engenhos que existiram no Paraná no século XIX, pode ser constatado pela analise de alguns autores que registraram esses dados: Pasinato (2003, p.9) coloca que “(...) em 1835, a região de Morretes e Paranaguá apresentava cerca de 20 fábricas de soque (...)”; Wachowicz (1988, p.128) afirma que “(...) em 1853, possuía o Paraná 90 engenhos de beneficiamento do mate (...)”; Oliveira (2001, p.27) evidencia que “(...) Por ocasião da Emancipação Política da Província do Paraná [1853] encontravam-se em Morretes 47 engenhos de erva-mate e em Curitiba, 29 (...)”.
A indústria do mate fez com que ocorresse um considerável incremento e também o crescimento nas atividades dedicadas a lhe servirem de assessório e a lhe dar suporte operacional. Os serviços de manutenção dos engenhos, a embalagem e o conseqüente transporte da erva-mate, exigiam as atividades de diversas empresas e profissionais em variados setores e atividades. Por exemplo: metalurgia, serrarias, marcenaria e gráfica, conforme demonstrado por Oliveira (2001).
Concentradas principalmente em Curitiba e região, essas empresas dedicadas a apoiar a produção de erva-mate, foram beneficiadas por este impulso extraordinário que atingiu todo o conjunto da economia paranaense. Ainda segundo Oliveira (2001) enquanto as exportações de erva-mate se mantiveram, essas empresas também se mantiveram em ascensão, pelo menos até que tivesse a crise econômica internacional de 1929.
A industrialização da erva-mate provocou uma melhoria constante em sua qualidade, o que favoreceu o aumento das vendas e a conquista de novos mercados. Iniciou-se um ciclo virtuoso na economia paranaense. A principal conseqüência econômica disso tudo, segundo Santos (2001) foi a inserção definitiva do Paraná no mercado internacional. Isto pode ser evidenciado pelo grande número de navios estrangeiros que passaram a atracar no Porto de Paranaguá para praticar o comercio e transportar a erva-mate para os mercados consumidores.

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