Centenários do Norte: Cem anos da Emancipação Politica de Cambará no Norte Pioneiro do Estado do Paraná
Prof. Dr. Roberto
Bondarik
Professor Titular da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná - Cornélio Procópio
Em 21 de setembro de 1924 foi instalado o Município de Cambará, um centenário que marca as comemorações de tantos outros vindouros nos próximos anos acompanhando o traçado da Ferrovia São Paulo – Paraná até adentrar Londrina. A importancia de Cambará para a história e a integração do Norte do Paraná à Civilização Ocidental é imensa pois foi aí, há cem anos, que o Paraná foi apresentado a Lord Lovat integrante da Missão Montagu que analisava a situação econômica e fiscal do Brasil para banqueiros britânicos. Lovat era um pesquisador das possibilidades de desenvolvimento do País, um prospector de investidores britânicos que haveriam de criar a Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP). Antonio Barbosa Ferraz Junior, interessado em alavancar seus negócios, foi quem mostrou a Lovat o potencial econômico da terra roxa, do café e abertura desta grande região ao mercado nacional e internacional. Os ingleses se interessaram e se tornaram pró-ativos na transformação de um sertão de matas maciças em um grande centro de produção agropecuária.
Barbosa Ferraz, ao que consta conheceu a região ao Norte e Oeste de Jacarezinho ainda por volta de 1908, participando de uma caçada que era uma atividade tão comum quanto as pescarias que hoje se promovem. Já havia fazendas e fazendeiros na área e descreviam-na como um “maciço de arvores frondosas”, sem clareiras. Aufere-se portanto que Barbosa Ferraz conheceu o solo coberto de mata fechada e as terras já aberta e com a prática da agricultura, talvez já com o café em franca produção.
A chegada
naquele ano de 1908 da Ferrovia Sorocabana à Estação de Ourinhos-SP possibilitou uma
facilidade no transporte de cargas em grandes volumes que favorecia a produção
agrícola em grande escala. Barbosa Ferraz adquiriu grande extensão de terras
atraído por sua fertilidade e pela ausência de uma legislação, como a existente
em São Paulo, que limitava a implantação indiscriminada de cafezais bem como o volume do seu transporte pelas ferrovias até o Porto de Santos. A sua Companhia
Agrícola Barbosa em pouco mais de uma década assumiria a posição de maior
estabelecimento agropastoril e também industrial, considerando todo o Estado do
Paraná, tornando-se inclusive foco de disputas politicas com a então sede do seu municipio, Jacarezinho. O projeto de expansão economica que se vislumbrava no inicio da década de 1920 não era compreendido e muito menos alvo de atenção e investimentos do Governo do Estado do Paraná daquela época, cujos esforços estavam em alavancar e perpetuar as atividades ligadas a extração, beneficiamento e exportação da Herva-Mate.
Cambará em seus primeiros decênios teve uma agricultura baseada na produção de café, com grandes fazendas que empregavam muitas vezes centenas de famílias de colonos. Registra-se que muitos, senão uma maioria, destes trabalhadores eram de origem estrangeira: italianos, espanhóis, eslavos, japoneses etc. Nestas fazendas adotavam um sistema em que ao colono era permitido cultivar principalmente o milho e o feijão em meio ao arruamento dos cafeeiros, além do arroz em áreas de baixada. A produção ou sua maior parte era de propriedade dos colonos que, atravez da ferrovia podiam levar o que colhiam para ser vendido em Ourinhos, Avaré, Sorocaba até São Paulo. Apesar do trabalho pesado e da quase inexistencia de proteções de leis trabalhistas inexistentes até muito tempo, esses colonos conseguiram, em sua grande parte adquirir terras na fronteira que ia se formando para além do Rio das Cinzas, transpondo o Laranginha, o Congonhas, o grande Rio Tibagi e se espraiando pela grande área da Companhia de Terras Norte do Paraná nos anos 1930. Destaque-se que o sistema de financiamento das companhias loteadoras era quase que auto-financiavel se houvesse a imediata ocupação e inicio do processo de produção das terras: derrubada da mata, extração da madeira mais valiosa, plantio do café, plantio de generos agricolas para sustento e comercio etc.
A possibilidade da extensão de um ramal ferroviário da Sorocabana até Cambará e mesmo adiante, a partir de Ourinhos, ideia que foi muito difundida no inicio dos anos de 1910 e seguintes, fez aumentar o afluxo de compradores de grandes extensões de terras na região. Compravam-se as propriedades nominais de antigas posses do século XIX, de seus herdeiros e mesmo de terras devolutas do Estado do Paraná. A Primeira Guerra Mundial limitou os mercados consumidores de café e algodão, fez desaparecer do mercado os trilhos de aço, locomotivas, vagões, explosivos para detonação de rochas no leito em construção das ferrovias, de 1914 até pelo menos 1920 houve uma grande pausa na região, no Brasil e no Mundo.
Como a extensão da
Sorocabana não foi efetivada, em 1920, impulsionados pelos discursos e artigos
publicados pelo Deputado Federal por São Paulo Cincinato Braga que defendia a
construção de uma ferrovia ligando Salto Grande à Guaíra, depois a Assunção no
Paraguai e sua interligação com os barcos a vapor argentinos dos Rios Paraná e
Paraguai, decidiu-se pela construção de uma ferrovia com recursos próprios dos
fazendeiros locais. Os Barbosa, Antonio e seus filhos, possuíam investimentos
muito diversificados e, ao que demonstraram, eram muito instruídos na potencial
capacidade econômica do Norte do Paraná, ainda um projeto de exploração. A
Ferrovia Noroeste do Paraná foi formalmente constituída em Agosto de 1920 para,
inicialmente, ligar por meio de uma estrada de ferro com um metro de bitola, a
localidade de Cambará até Ourinhos, meta atingida completamente até 1925. A
concessão de construção contemplava a sua extensão até Jataizinho, na Comarca
de Tibagi, tendo seus estudos e projetos sido feitos nos anos seguintes. Essa
ferrovia seria adquirida pelos britânicos da Paraná Plantations, tornando-se o
embrião fecundo que geraria Cornélio Procópio, Londrina até Maringá.
Sob a égide da Companhia Agricola Barbosa Cambará tornou-se Município com interesses econômicos um tanto que
diversos daqueles que conduziam Jacarezinho e o Estado do Paraná àquele tempo. Uma série de
conflitos envolvendo a Companhia, seus proprietários e o Juiz de Jacarezinho
levaram a implantação da Comarca de Cambará em 1928. A cidade foi o ponto de
passagem para todos os que buscaram “fazer o Norte”, se “firmar na vida”,
trabalhando nos sertões do Norte do Paraná tornados acessíveis pela CTNP.
Meu cafezal em flor,
quanta flor no meu cafezal! Cem anos de Norte do Paraná, de trabalho, de
dedicação e de construção de uma cultura pé vermelha!