sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

PONTE “ALVES DE LIMA” E A REVOLUÇÃO DE 1930 NO NORTE PIONEIRO DO ESTADO DO PARANÁ

Prof. Ms. Roberto Bondarik*

bondarik@utfpr.edu.br


A Ponte “Alves de Lima”, ligação rodoviária entre as localidades de Ribeirão Claro, no Estado do Paraná, e Chavantes, no Estado de São Paulo, foi construída na década de 1920 com objetivo de escoar a produção de café do Norte do Paraná. Os estudos visando s a sua construção foram realizados em 1918, conforme histórico do Município de Chavantes-SP, publicado pelo IBGE:

1918 - São feitos os estudos para a construção da Ponte "Alves Lima" - PONTE PÊNSIL DE CHAVANTES". (IBGE, 2008)[1]

Outra referência a esta obra, encontra-se na Mensagem do Presidente do Estado do Paraná ao Poder Legislativo, em 1920[2]. Há neste documento o comunicado do Presidente Dr. Affonso Alves de Camargo referente a esta construção e o acordo feito entre os Estados do Paraná e de São Paulo, referente ao financiamento e autorização da condução da obra.


Attendendo[3] ao auxilio pedido por vários moradores dos Municípios de Jacarésinho e Ribeirão Claro, o Governo autorizou a construcção de uma ponte pencil de 77m10 de vão livre sobre o Rio Paranapanema no Porto Emygdão, na estrada de Ribeirão Claro a Chavantes. Para a execução desse melhoramento cujos serviços estão em andamento, o Paraná concorrerá com 50:000$000 [cinqüenta contos de réis] e São Paulo com 40:000$000 [quarenta contos de réis], correndo o resto das despesas por conta dos demais interessados (MENSAGEM PRESIDENCIAL DO ESTADO DO PARANÁ 1920, p.59)

Confirma-se portanto o início da construção da Ponte Alves de Camargo no ano de 1919, uma vez que a mensagem referida foi apresentada em 1920. A construção foi conduzida pelos dois governos estaduais mais a iniciativa privada, formada por fazendeiros do Município de Ribeirão Claro.

A mensagem presidencial de 1921, apresentado pelo Presidente do Estado do Paraná, Dr. Caetano Munhoz da Rocha, apresenta os valores totais do orçamento da construção desta ponte, que se encontrava em andamento. O valor total da obra estava orçado em 103:270$000 (cento e três contos, duzentos e setenta mil réis), como relatado pelo Presidente:


Em execução: Ponte pênsil sobre o Rio Paranapanema na estrada de Ribeirão Claro a Chavantes, auxilio á Comissão constructora 50:000$000 [cinqüenta contos de réis]. O Estado de São Paulo contribue também com 40:000$000 [quarenta contos de réis] para essa construcção que esta orçada em 103:270$000 [cento e três contos, duzentos e setenta mil réis], cabendo aos fazendeiros do município de Ribeirão Claro, o pagamento da quantia restante de 13:270$000. (MENSAGEM PRESIDENCIAL DO ESTADO DO PARANÁ 1921, p.55)

A mensagem apresenta ainda os valores pagos e a pagar até aquele momento (1921):

Valor total dos serviços 77:760$013

Importância paga 27:760$013

----------------

Saldo a pagar 50:000$000

(MENSAGEM PRESIDENCIAL DO ESTADO DO PARANÁ 1921, p.55)

Com a sua conclusão e uso, a Ponte “Alves Lima” tornou-se um importante elo de ligação entre o Norte do Paraná e o Estado de São Paulo, permitindo o escoamento da produção agrícola da região e o fluxo crescente de pessoas. Devido a sua importância logística, a ponte foi alvo de especial atenção durante a Revolução de 1924 em São Paulo e principalmente na Revolução de 1930, que alçou Getúlio Vargas ao poder.

Após a eclosão da Revolução de 1930 no Rio Grande do Sul e a conseqüente adesão das forças militares federais e estaduais no Estado do Paraná, o Governo Federal e do Estado de São Paulo deslocaram forças para esta região. Devido à importância do Norte Pioneiro do Paraná, forças militares vindas diretamente do Rio Grande do Sul trataram também de assegurar o seu controle.

Tropas legalistas (paulistas) e revolucionarias se enfrentaram em Quatiguá-Pr, nos dias 12 e 13 de Outubro de 1930. Derrotados os paulistas se retiram em direção ao Estado de São Paulo.

O inimigo tenta então fazzer uma retirada em ordem, a qual não pode ser levada a effeito, como pretendia o adversário, em virtude da acção immediata da nossa infantaria que, apoiada pela artilharia e pelos fogos da companhia de metralhadoras pesadas desarticulou logo as suas linhas, rompendo-as com tal impetuosidade que o adversário desorganisado empreende uma fuga desastrosa. (VÉRAS, 1933, p. 00)

Ana Godoy[4] relata que seu pai, no dia 13 de outubro, logo após o fim do combate em Quatiguá, recebeu em sua casa um oficial paulista que lhe relatou que haviam sido derrotados, o comandante da coluna legalista havia dado a ordem de debandar e fugir em direção ao Estado de São Paulo. O próprio Coronel Alcides Etchegoyen, comandante do Destacamento Revolucionário, citado por Véras (1933), menciona a fuga das forças legalistas em direção às divisas de São Paulo e a suposta segurança nas margens paulistas dos rios Itararé e Paranapanema. A destruição das pontes que ficavam pelo caminho demonstram o quanto o combate deve ter sido traumatizante e também apontam que as forças legais não se encontravam preparadas para dar combate às tropas regulares e profissionais como as que se deslocavam a partir do Rio Grande do Sul e agora se espraiavam pelo Norte Pioneiro do Paraná.

No relatório sobre a sua columna dia o bravo coronel Etchegoyen, referindo-se a fuga do adversário: “O seu dispositivo esfrangalhou-se, o pânico se manifestou em suas fileiras, veiu a desordem e a confusão. A ninguém mais seria dado conter aquella tropa cheia de terror, cujo pensamento único era fugir e cuja fuga era cortada pelo fogo das nossas metralhadoras pesadas que a fusilava em massa. As populações das cidades e villas, ao longo da via férrea Quatiguá-Jacaresinho, são testemunhas do estado de desmantello e desmoralisação das tropas adversárias em fuga, as quaes tomadas de pavor e viajando em caminhões incendiavam, com auxilio de gazolina, as pontes e pontilhões ao longo da estrada, afim de evitar a perseguição de nossa tropa e destruindo a dinamite de uma maneira bárbara as pontes lançadas sobre o Paranapanema e incendiando todas as balsas, botes e canoas existentes nos diversos passos daquele rio, abandonando em definitivo naquella região, o Estado do Paraná.” (VÉRAS, 1933)

Desta forma destruíram a forças paulistas e federais, leais ainda ao Presidente da República, Washington Luiz, a ponte ferroviária em frente à Ourinhos-SP e Jacarezinho-PR, e a ponte pênsil rodoviária (Alves de Lima) defronte a Chavantes-SP e Ribeirão Claro-Pr. O Jornal a Gazeta do Povo publicou um relato de um morador de Jacarezinho, para quem a retirada das forças paulistas e do Governo Federal do Norte do Paraná teria se constituído em uma verdadeira fuga. O relato de Candido Berttrer, foi publicado no dia 24 de Outubro de 1930.

O sr. Cândido Berttrer Fortes, fazendeiro e commerciante em Jacarezinho, é um velho amigo da GAZETA DO POVO, e um dos nossos muitos assignantes naquella região.

Testemunha dos últimos acontecimentos desenrolados em Jacarezinho, o sr. Cândido Fortes, veio a nossa reducção, afim de narrar pormenorisadamente, para os leitores da GAZETA DO POVO, tudo quanto se passou, naquella localidade, nestes últimos dias.

Disse-nos que na madrugada de 12 para 13 do corrente[5], as forças paulistas, que haviam dado combate em Quatiguá, sob o commando dos coronéis Sandoval e Agnello passaram por Jacarezinho, em verdadeira debandada, apavorados com a perseguição de tropas revolucionárias.

As forças governistas – disse-nos o nosso informante – entraram pelas ruas de Jacarezinho, trazendo cada soldado, na ponta do fuzil uma bandeira branca. Chegaram completamente desmoralizados, dizendo que haviam combatido durante 15 horas.

Qual era o efectivo dessa tropa?

Mais ou menos, mil e duzentos homens – respondeu-nos o sr. Candido Fortes.

No dia 14 – continuou nosso entrevistado – as tropas governistas começaram a abandonar a cidade. Nessa retirada commeteram uma série enorme de depredações, causando innumeros damnos à cidade. Incendiaram duas pontes do Ribeirão “Fartura”. Mais adeante, na ponte “Mello Peixoto”, sobre o rio Paranapanema, deitaram grande quantidade de gazolina, incendiando-a também. A ponte metallica da E. de ferro S. Paulo-Paraná também foi bastante dannificada. Dynamitaram os pilares que ficam em território paulista, destruindo grande parte da linda ponte. (GAZETA DO POVO, 24 de Outubro de 1930, p.01)[6]

A destruição da ponte pênsil provocou inúmeros problemas aos habitantes do Norte do Paraná, pois o transporte rodoviário ficava desta forma interronpido, sendo feito por balsas. Em dezembro de 1930, a Gazeta do Povo publicou noticia de sua sucursal em Jacarezinho, referente a acidente com um caminhão transportado por balsa no Rio Paranapanema, que cheio devido a chuvas torrenciais apresentava perigoso à navegação e travessia. Comenta-se também a sobre os autores da destruição da ponte:

Ainda não fizemos nesta sessão nenhum commentário sobre a covardia das forças que se intitulavam legalistas e que tiveram a desfaçatez de incendiar a Ponte da Estrada de Rodagem sobre o Rio Paranapanema, que nos ligava a praça de Ourinhos, de onde recebe o nosso comercio a maioria de suas mercadorias.

Covardes e asquerosos esses assalariados tiveram ainda o desplante de fazer ruir a parte paulista da ponte da Estrada de Ferro sobre o mesmo rio.

Resultado desse crime, estamos soffrendo nós agora, pois ficamos sem ponte para a passagem de automóveis, sujeitando-nos a perigosa travessia em balsas.

Ultimamente com as chuvas torrenciais que tem cahido, o leito do rio Paranapanema esta muito cheio e caudaloso, apresentando um grave perigo a sua travessia em balsa como se vem fazendo.

No sábado ultimo, 20 do corrente, um caminhão da firma Eduardo Salgueiro, de Cambará, carregado de mercadorias, tombou da balsa e afundou no rio, numa profundidade de 8 metros.

O chauffeur depois de ter cahido juntamente com o vehiculo, conseguiu submergir.

O caminhão trazia 2 tambores de gazolina que já foram salvos, perdendo-se o restante das mercadorias, inclusive 500 saccos vasios. (GAZETA DO POVO, 28 de Dezembro de 1930, p.08)[7]

Os prefeitos da região, inclusive de Ourinhos, procuravam os governos de seus Estados para conseguir a reconstrução das pontes destruídas.



* Professor e Pesquisador. Mestre em Engenharia de Produção, Especialista em História e em Gestão Industrial, Graduado em História e Geografia. Docente da Universidade Tecnológica Federal do Paraná e Secretaria de Estado da Educação do Paraná.

[1] Disponível em <> Acesso em 15 de Janeiro de 2008;

[2]Mensagem Dirigida ao Congresso Legislativo do Estado pelo Dr. Affonso Alves de Camargo, Presidente do Estado do Paraná, em 1º de Fevereiro de 1920, p.59;

[3] Foram mantidas em todas as citações a ortografia original da época;

[4] Entrevista não gravada com o autor em 08 de setembro de 2007, em sua residência em Quatiguá-Pr;

[5] È possível que um equivoco de datas tenha ocorrido quando da publicação ou da referência dada por Cândido Berttrer. A data correta deve ser a madrugado dos dias 13 para 14 de outubro. A derrota da força legalista em Quatiguá ocorreu na manhã do dia 13 de outubro de 1930. (Nota do Autor);

[6] A DEBANDADA DAS FORÇAS PAULISTAS E SUA PASSAGEM POR JACAREZINHO. Dia 24 de Outubro de 1930 – Nº 4.179 – Ano XI – p.01;

[7] DESASTRE NO RIO PARANAPANEMA. Dia 28 de Dezembro de 1930 – Nº 4.245 – Ano XI – p.08;

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